Dr. João da Silva, profissional muito bem sucedido, cujo auge da carreira ocorreu nos anos 70 (período em que a odontologia acontecia praticamente “sozinha”, sem grandes esforços), agora divide o consultório com o filho Dr. João Silva Júnior, que acaba de se formar e já está fazendo especialização.
Júnior tem ideias audaciosas e acredita que a clínica precisa passar por uma radical transformação, tanto do ponto de vista da estrutura física quanto no modelo de atendimento, equipamentos etc. Ele quer informatizar tudo e abandonar o sistema de agendamento em papel, além de estar considerando seriamente atender a pacientes de convênios. Já seu pai, o Silva Sênior, possui convicção de que já encontrou a fórmula do sucesso e costuma defender a tese que “em time que está ganhando não se mexe”, mesmo tendo convicção de que a odontologia hoje está “cada dia pior” e “já não é mais como era antigamente”. Ele detesta informática e detesta ainda mais a ideia de ter pacientes de convênios em sua agenda diária. O conflito está apenas começando...
Viajando por este país afora para ministrar cursos de gestão, marketing, vendas e outros, tenho visto que este problema vem crescendo muito e há dezenas de casos cujo final não foi nada bom para nenhuma das partes envolvidas. Este cenário nada promissor me fez pensar sobre o assunto e escrever este pequeno artigo, não para elucidar a questão (se é que isso seja possível) mas apenas para sugerir ponto de partida para reflexão.
Pelo que percebo, este problema de pensamentos divergentes de gerações quanto aos rumos da atividade profissional em consultório surgiu com maior força nos últimos 15 anos, e isso parece ter ocorrido por três principais motivos:
1. Houve uma explosão de novos profissionais no mercado de trabalho, quando os filhos de profissionais bem sucedidos ainda acreditavam forte na odontologia, ou pessoas de famílias sem cirurgiões-dentistas entre os seus viam na profissão um modelo de status, autonomia, ou trabalho com boa remuneração;
2. O mundo mudou radicalmente neste período e a nova geração, mais adaptada à tecnologia e a inovação, rejeitou o que lhe parece “inércia” da geração anterior;
3. Derivado destas mudanças que o mundo sofreu, o paciente passou a ser cliente, a ter muitas opções de profissionais para atendê-lo, a ter acesso à informação rápida e a pensar em termos de direitos, o que lhe é garantido pelo Código de Defesa do Consumidor. O cliente é muito mais seletivo e assediado do que era no passado, alterando radicalmente a sua forma de relacionamento com o profissional.
Enquanto a geração anterior admirava segurança no trabalho, autonomia absoluta e relações de longo prazo, a nova apregoa a inovação, o descartável, o risco e, de certa forma, o curto prazo. Como lidar com esta situação conflituosa?
Embora a questão seja polêmica e muito complexa, aqui vão algumas sugestões sobre a questão para que possamos, pelo menos, iniciar uma boa reflexão sobre o assunto.
Recomendo:
1. Ambos (representantes das diversas gerações dentro de uma mesma clínica) devem conversar sobre o que pensam a respeito da clínica, de suas carreiras e de como as projetam para o futuro. Falem de seus sonhos, angústias e expectativas sobre todas as coisas relacionadas a trabalho.
2. Provavelmente o melhor caminho será o do meio, nem tanto a terra nem tanto ao mar. Aprendam a negociar e, se necessário, a ceder em pontos que não sejam chave ou que interfiram em pontos éticos. Nenhum de você é dono da verdade.
3. Não tenham medo da mudança e de fazer investimentos que envolvam algum risco calculado. No entanto, procurem estar cercados de boas informações para a tomada de decisão e, sempre que possível, busquem ajuda profissional em áreas que não dominam, como por exemplo: arquitetos, decoradores, consultores, contadores, advogados etc.
4. O ambiente de trabalho deve ser sagrado. Cuidado para não deixar o relacionamento entre vocês descambar e o ambiente ficar insustentável. Os funcionários percebem isso e ficam inseguros e partidários. Jamais os envolvam em disputas de qualquer natureza.
5. Não se contentem com qualquer coisa, busquem o melhor, inclusive talentos para trabalhar em sua equipe. Procurem pessoas melhores do que vocês, pois só assim crescemos. Ao analisarem as alternativas que estão sobre a mesa verifiquem qual ou quais são as que trazem melhores resultados para o coletivo, e não apenas para uma pessoa em particular.
6. Não tenham medo de delegar tarefas. Excesso de centralização costuma ser péssimo para todo mundo.
7. Uma geração tem muito a aprender com a outra. Encontrem essas oportunidades de aprendizado e crescimento pessoal um no outro. Procurem - juntos - modelos de sucesso tanto de uma geração quanto da outra, pois isso os ajudará a encontrar a melhor de cada um.
8. Jamais percam de vista que o paciente está em primeiro lugar e que, independente do método ou forma, a sua equipe é quase tão importante quanto sua carteira de clientes.
9. E, por fim, um último conselho: nunca deixe que os problemas profissionais do trabalho envolvam a sua relação familiar. Se o conflito estiver caminhando numa direção ruim, prefira cair fora e montar outro negócio ou trabalhar em outro local.
Sucesso.